domingo, 10 de abril de 2011

Márcio Thomaz Bastos assume defesa da política de cotas raciais




O ex-ministro acatou sugestão de Eloi Ferreira e defenderá sistema de cotas
Por Suzana Varjão
Um dos mais destacados juristas brasileiros, Márcio Thomaz Bastos acaba de ser admitido como defensor da política de reserva de vagas para negros nas unidades de ensino superior do País. Ao adotar o sistema de cotas, a Universidade de Brasília (UnB) foi contestada pelo Partido Democratas (DEM), que ajuizou ação no Supremo Tribunal Federal (STF), arguindo a inconstitucionalidade da medida. O ex-ministro da Justiça pediu para ser ouvido sobre o assunto no STF, que acatou a solicitação.
A UnB decidiu adotar o sistema de cotas em 2004, porque “a universidade brasileira é um espaço de formação de profissionais de maioria esmagadoramente branca”, e, “ao manter apenas um segmento étnico na construção do pensamento dos problemas nacionais, a oferta de soluções se torna limitada”, como registrado no site da instituição. Entretanto, o DEM entrou com uma Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF), alegando violação de princípio constitucional.
AMICUS CURIAE – A ADPF 186 está para ser julgada pelo Supremo Tribunal Federal, mas a Associação Nacional dos Advogados Afrodescendentes (ANAAD), representada, gratuitamente, pelo escritório de Márcio Thomaz Bastos, solicitou a admissão formal de sua intervenção no processo, na qualidade de Amicus Curiae. Um dos principais articuladores da estratégia, o presidente da Fundação Cultural Palmares (FCP), advogado Eloi Ferreira de Araujo, comemorou o deferimento do pedido.
O Amicus Curiae (“Amigo da Corte”, em latim) está inserido na legislação brasileira – mais precisamente, no parágrafo 2º, artigo 7º da Lei 9.868, de 1999. Resumidamente, consiste numa figura jurídica que, não fazendo parte de determinado processo, solicita audiência em julgamentos de grande relevância para a sociedade, com o intuito de prover os tribunais de informações sobre questões com grau elevado de complexidade, como é o caso do sistema de cotas.
ARTICULAÇÃO – Carlos Alves Moura, advogado e ex-assessor da Secretaria Especial de Políticas de Promoção da Igualdade Racial da Presidência da República, acompanhou de perto o trabalho de articulação do então titular da SEPPIR, Eloi Ferreira de Araujo, junto à ANAAD e ao jurista Márcio Thomaz Bastos. E também comemora o resultado positivo da petição encaminhada ao ministro do STF e relator do processo, Ricardo Lewandowski.
– Conseguir esse patrocínio de um dos maiores juristas do País é um ganho muito grande para a causa, resume Moura.
Eloi Ferreira explica que a decisão de buscar o apoio de Thomaz Bastos deveu-se ao risco de reversão do processo de inclusão da população descendente de africanos escravizados nas universidades públicas brasileiras. Após a instituição da reserva de vagas para negros, pela UnB, e do grande debate aberto a partir da adoção desta medida, várias outras unidades aderiram ao sistema (ver quadro abaixo), aumentando consideravelmente o número de afrodescendentes na rede de ensino superior do País.
ARGUMENTOS – Foi exatamente o impacto social provocado pela decisão do STF que a ANAAD arguiu, para afirmar a relevância da matéria a ser julgada e justificar o recurso do Amicus Curiae. Os efeitos negativos sobre as universidades que já adotam o sistema de cotas e os matriculados e diplomados a partir deste critério de seleção são algumas das consequências listadas pelos advogados, e que deverão ser levadas em consideração pelos ministros do Supremo.
Para além do mérito da questão sob análise, a ANAAD questiona a validade do instrumento jurídico empregado pelo DEM. Pela Lei 9.882/99 (artigo 4º, parágrafo 1º), a ADPF só pode ser usada quando não há “qualquer outro meio eficaz de sanar a lesividade”. Na petição, os advogados lembram que “à época da propositura da ação, sustentava-se que a ADPF seria o único meio para questionar a constitucionalidade da reserva de vagas por critérios raciais nas universidades”.
ESTATUTO – A partir, porém, da entrada em vigor do Estatuto da Igualdade Racial (Lei12.288/2010), houve “uma mudança relevante no cenário legislativo, quando comparados o momento em que a ação foi proposta e o momento atual. As normas sobre o tema mudaram de tal forma que a ADPF perdeu seu sentido original”, argumentam. Se antes a política de reserva de vagas da UnB tinha como único norte a Constituição Federal, o Estatuto, agora, é o seu referencial direto.
Mas é no capítulo sobre as “Razões de mérito” que se encontra o cerne do debate. Demonstrando que, “a despeito das boas intenções normativas”, as estatísticas apontam desequilíbrios gritantes entre negros e não-negros, argumenta-se que “a política que tem como enfoque apenas a superação das distinções socioeconômicas não é suficiente para resolver o antigo problema da discriminação e do preconceito”.
Chamando a atenção sobre a importância de não se confundir “a disctinctio necessária à realização do princípio da igualdade de oportunidade com a discriminação odiosa proibida pela norma constitucional”, o documento-manifesto lembra que “é tarefa do Direito reconhecer critérios legítimos de distinção, equiparando condições desiguais”. E sinaliza:
“Somente quando a igualdade formal se traduzir em igualdade real poderemos nos orgulhar da consolidação da nossa democracia” (POCHMANN, em Retrato das desigualdades de gênero e raça).



Fonte: http://africas.com.br/site/index.php/archives/10800

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